sexta-feira, 26 de agosto de 2011

"Na Natureza Selvagem" e Tolstói



"Assim vivemos na cidade. Na cidade um homem pode viver cem anos, sem se dar conta que está morto há muito tempo." - Tolstói.


Tolstói, em face de seu amor ao campo e bastante influenciado por Rosseau, bem como por sua teoria do "bom selvagem", nunca viu o ambiente da cidade com bons olhos. Contos como A morte de Iván Ilitch ou Três Mortes, em parte, resultam dessa sua visão. O camponês seria mais "humano" por estar mais próximo à natureza, enquanto o homem da cidade, a exemplo de Iván Ilitch, é absorvido pela burocracia e tudo em sua vida acaba se transformando em "coisa", em - como diria Marx - objeto reificado.


No filme Into The Wild (No Brasil, Na Natureza Selvagem), lançado em 2007, com direção de Sean Penn e baseado na trajetória verídica de Christopher McCandless, estudante norte-americano que abandona o que entendemos por civilização para viver entrelaçado à natureza, fica evidente o quão pernicioso pode ser o meio urbano.


Já há algum tempo em contato profundo com a natureza e tudo que isso reivindica; bem como desvinculado dos valores comuns à urbe, o aventureiro retorna, por descuido e anônimo, à cidade grande. Quando enfurnado na mata, o rapaz, ávido leitor de Tolstói, Jack London e Henry David Thoreau, torna-se um jorro de vitalidade estóica que cativa o espectador, estando em equilíbrio e confluência com o meio ambiente. À medida que adentra o habitat metropolitano, contudo, ele se converte em só mais um naco na multidão despedaçada, onde as pessoas não se vêem, não se tocam, não se ouvem e a menor menção ao natural cai na armadilha do mercado, cuja gosma produzida narcotiza os sentidos e cria padrões. Nesse não-lugar, ele se torna um número no antebraço, uma estatística no holocausto, um indivíduo espezinhado pela civilização, pela tecnologia, pela burocracia; inepto a encaixar-se em modelos artificiais e removido ao fundo do poço de uma estrutura.


O filme, no entanto, nos alerta para o outro lado da moeda, que também é previsto por Tolstói. Sem a companhia do outro e destituído do conhecimento milenar do "selvagem", McCandless é devorado por aquilo que ainda lhe resta de postiço. Em contos como De que vivem os homens, Tolstói deixaria claro que ninguém vive isoladamente, visto que, para nos matermos vivos, devemos viver para os outros. Deus, assim, teria revelado ao homem não apenas o que lhe é útil, mas o que é necessário também ao outro.



Outros filmes:



Viver (Ikiru) de 1952 - Akira Kurosawa
O enredo do filme do celebrado diretor japonês é baseado na novela A Morte de Iván Ilitch. Nesta, um burocrata encontra o sentido da vida através do processo da morte.



A Ultima Estação (The Last Station) de 2009 - Michael Hoffman
Com roteiro adaptado do romance homônimo de Jay Parini, o filme conta como foram os últimos dias da vida de Tolstói, quando sua mulher atingiu um estado demencial em função do patrimônio literário do marido, entrando em conflito com o mais devotado seguidor de Tolstói, Tchertkov. Nessa trilha, Tolstói fugiria de casa para viver em uma cabana como camponês. Por obra do destino, entretanto, ele acabaria desembarcando na desconhecida Estação Astapovo.


quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Mini-perfil dos participantes e dia-a-dia

Vladímir Ilítch Tolstói

Primeiro Encontro (14.09.2011) às 19:30
Tema: O Universo de L. Tolstói
Palestrante:
Conde Vladímir Ilítch Tolstói: Presidente da Fundação Lev Tolstói, Diretor do museu de Lev Tolstói “Iasnáia Poliána” e trineto de Tolstói. Ele também é jornalista e autor de inúmeros artigos e ensaios sobre Tolstói.
Mediadora e Debatedora: Elena Vássina (Prof. Dra. De Literatura Russa, USP)

Pavel Bassinsky


Segundo Encontro (15.09.2011) às 19:30
Tema: Tolstói, grande humanista.
Palestrante:
Pavel Bassinsky: escritor e crítico literário russo, ganhador de importantes prêmios literários, membro do júri do Prêmio Literário “Iásnaia Poliana”/ Lev Tolstói. Seu último livro Lev Tolstói, uma fuga do paraíso (2010) tornou-se um best seller internacional e está sendo traduzido no Brasil.
Mediador e Debatedor: Aurora Bernadini (Profa. Dra da Literatura Russa / USP)

Igor Vólguin


Terceiro Encontro (16.09.2011) às 19:30
Tema: Tolstói e a literatura contemporânea.
Palestrante:
Já conhecido pelo público eslavófilo brasileiro por ter participado do seminário sobre Dostoiévski no CCBB, Igor Vólguin é um destacado poeta, escritor e pesquisador russo. Autor de várias coletâneas de poesia e livros sobre a literatura e história russas, como O último ano de Dostoiévski; Anotações históricas (1986); Nascer na Rússia; Dostoiévski e os contemporâneos, vida em documentos (1991); Metamorfoses de poder (1994); A Devolução do bilhete e Paradoxos da consciência nacional (2004). Seu último livro Fugir de todos: Lev Tolstói como peregrino russo (2010) ganhou o prêmio da revista literária “Oktiabr”. Ele também é fundador e presidente da Fundação Dostoiévski, membro do PEN CLUB e professor titular da Universidade Estatal de Moscou Lomonóssov e do Instituto de Literatura Górki.
Mediadora e debatedora: Arlete Cavaliere (Profa Dra da Literatura Russa da USP)


Quarto Encontro (17.09.2011) às 15:00
Tema: Tolstói e tolstoísmo hoje, no Brasil e no mundo / Mesa redonda sobre as questões de não violência, de amor na obra de Tolstói e as traduções de Tolstói no Brasil.
Participantes:
Bruno Gomide (Prof. Dr. De Literatura Russa , USP), Dante Marcello Claramonte Gallian (Prof. Dr UFESP), Elena Vássina (Profa. Dra. De Literatura Russa , USP), Noé Siva (Prof Dr de Literatura Russa, USP)

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

A Sonata a Kreutzer e Beethoven

Há quem diga que um ser humano de posse de suas faculdades normais jamais escreveria um romance como A Sonata a Kreutzer. O rebento literário de Tolstói, nascido da nebulosa fase pós-conversão, faz apologia ao fim da humanidade pela prática da abstinência sexual e, dentre outras coisas, sugere que as crianças são meros apêndices cuja função é tumultuar a vida dos pais. Nesse rastro, a música, para Tolstói, sobretudo a de Beethoven, trata-se de um ente absurdo que só serviria para despertar "condicionamentos" desnecessários, eventualmente violentos ou irracionais, uma vez que não próprios de quem a ouve, mas de quem a compõe (?).
Bóris Schnaiderman, tradutor de Tolstói, aponta que A Sonata a Kreutzer, publicada em 1891, foi um capítulo negro na trajetória do autor, que revela a necessidade de "expor publicamente, em forma concentrada, a sua obsessão". E arremata: "Com sua carga de exacerbação da emotividade, A Sonata a Kreutzer desafia-nos até hoje e parece insistir em que a literatura nos obriga às vezes a conviver com aquilo que nos parece mais odioso em nosso cotidiano".

E o que dizer sobre as aparições de Ludwig van Beethoven na literatura?
Até onde eu sei, ele não infernizou apenas a vida do personagem Póznichev de Tolstói, mas a de Alex, protagonista do livro A Laranja Mecânica de Anthony Burgess, que, ao passar por um procedimento bastante peculiar, não consegue mais ouvir sua música preferida - A Nona Sinfonia; e, em solo tupiniquim, a do pianista Menandro Olinda, no brilhante romance Incidente em Antares de Érico Veríssimo. Este entrava em colapso "em vida" diante de Appassionata.


TOLSTÓI no CCBB

Se você tem intimidade com a literatura, sabe que o legado desta, de uma maneira geral, vai muito além do que possam prever os vendedores de livros ou os leitores. Se você conhece a obra daquele que é considerado um dos maiores mestres da literatura mundial, Lev Tolstói, deve estar ciente também de que sua influência se deu em inúmeras esferas: a religiosa, a social, a cultural e não somente a literária.

O autor de Anna Kariênina e Guerra e Paz, dentre outras obras-primas, possuía um universo muito próprio e muito amplo a um só tempo, que inundou de idéias, no campo político, por exemplo, figuras tão díspares - embora engajadas em mudar o mundo - quanto Gandhi, Martin Luther King ou John Lennon. "Give peace a chance", clamaria o ex-beatle incitado pela tese da não-resistência ao mal pela violência formulada por Tolstói, um conde que amava a simplicidade camponesa e jamais tolerou a guerra.

O blog do Seminário Internacional "O Legado de Lev Tolstói para o século XXI", que irá ocorrer no CCBB - SP do dia 14/09 ao dia 17/09 de 2011, pretende reunir em um só espaço virtual as pessoas que se interessam pela obra, ou gostariam de conhecer esse grande autor, a fim de aproveitar ao máximo as conferências que se realizarão no CCBB e, claro, tirar dúvidas sobre o assunto. Aqui teremos entrevistas, textos e discussões sobre Tolstói e suas obras, além de acompanharmos o dia-a-dia do evento.

O evento contará com as presenças ilustres do Conde Vladímir Tolstói no dia 14, com o tema "O Universo de Tolstói"; Pavel Bassinski no dia 15, com o tema "Tolstói, grande humanista", Igor Vólguin no dia 16, com o tema "Tolstói e a literatura contemporânea". No dia 17, haverá um mesa com palestrantes nacionais ligados à obra do autor, como a tradutora e professora dos cursos de pós-graduação em Literatura e Cultura Russas da USP Aurora Fornoni Bernardini, além de outros membros do corpo docente desta universidade e de outras.

Sejam bem-vindos e divulguem!!!